Moedas
D. João VI e suas realizações
D. João VI e Carlota Joaquina, uma rainha tipicamente espanhola (uma continua fonte de problemas).
Contexto Histórico
Em finais do século XVIII a Europa é varrida por um forte movimento expansionista francês, nascido da Revolução de 1789 e que era protagonizado pelo ditador Napoleão Bonaparte. As tropas francesas invadiram então todo o continente europeu, derrubando regimes, matando e pilhando as populações, deixando atrás um rasto de destruição.
Na Península Ibérica, a Espanha traindo a aliança que tinha com Portugal, alia-se à França e planeiam invadir e repartirem entre si o país, aliado da Inglaterra. A primeira invasão conduzida pela Espanha ocorre em 1801, terminando com a usurpação de Olivença.
Os dois países, em 1807, ameaçam de novo Portugal que caso não declarasse guerra à Inglaterra seria invadido. Portugal está sozinho e sem apoios para uma ofensiva terrestre em larga escala, dado que a Inglaterra dominava apenas os mares, e em terra havia perdido todas as batalhas com os franceses.
Os estratégias de Portugal, desde a guerra com a Espanha entre 1640 e 1668, que tinham concebido um plano para o caso de não poderem resistir ao invasor: transferir a Corte para o Brasil, a maior das suas colônias no mundo.
Três dias antes de Junot entrar em Lisboa (30/11/1807), a família real portuguesa, acompanhada por mais de 10 mil nobres, clérigos e altos funcionários do Estado transfere-se para o Brasil. Dezenas de navios transportam para o outro lado do Atlântico um vasto espólio documental que lhes permitiu replicar no Brasil o estado português. O império passaria a ser governado a partir do Rio de Janeiro, a nova capital do reino.
Era uma operação única na Europa pela sua dimensão e alcance político. Apenas no século XX os monarcas europeus se dignarão visitar as suas colônias fora deste continente.
Brasil
Entre 1808 e 1821, o Brasil viveu num curto espaço de tempo a maior transformação da sua história. Nunca os progressos alcançados foram tão rápidos e duradores. Quando D. João VI regressa a Portugal após 13 anos nos trópicos, deixa atrás de si um "império" com um Estado e instituições consolidadas não apenas no plano interno, mas também internacional. Trata-se de um feito extraordinário de um rei apresentado como "indeciso".
D. João VI, ainda príncipe regente, desembarcou em Salvador, na Bahia, a 22 de Janeiro de 1808, só chegando ao Rio de Janeiro a 8 de Março de 1808. A colônia que encontrou tinha as suas fronteiras praticamente definidas, possuindo uma forte unidade interna e sem grandes movimentos separatistas, característica comum às colônias espanholas.
Seguindo um plano previamente definido, mal chegou ao Brasil, tratou desde logo de criar um novo reino à imagem do Estado Português. Em menos de 7 anos, o Brasil ascendia já à categoria de "Reino Unido a Portugal e Algarves " (1815), na prática era o seu reconhecimento como um reino e o Rio de Janeiro como a capital do império português. Não existe em todo o mundo uma situação similar.
Administração pública.
O Brasil foi dotado de estrutura política-administrativa complexa. Na cúpula tinha apenas três ministérios: o da Guerra e Estrangeiros, o da Marinha e o da Fazenda e Interior. Foi criada a Casa de Suplicação (Supremo Tribunal), Intendência Geral da Polícia, etc. As capitanias transformaram-se em províncias (1816), e tudo mais seguiu a mesma estrutura existente em Portugal. Se não encontrava no Brasil quadros qualificados para a Administração Pública, requisitava-os de Portugal.
D. João VI desde o inicio que deu sinais claros que estava a criar um novo Estado, embora replicado do existente em Portugal. Criou no Brasil também uma nova nobreza. Entre 1808 e 1821 concedeu títulos a 28 novos marqueses, 8 condes, 16 viscondes, 21 barões, 4 mil cavaleiros.
Política Externa.
Nada foi deixado ao acaso na afirmação do Brasil no Mundo, os diplomatas portugueses no estrangeiro promoviam ativamente a imagem do novo Estado. O próprio D. João VI foi o primeiro e o único monarca europeu que se fez coroar no Novo Mundo (1818), como o 27º rei de Portugal e o 1º do Reino Unido do Brasil e Portugal. O casamento do seu filho D. Pedro foi feito no Rio de Janeiro com Dona Leopoldina, filha do arquiduque da Áustria, uma das grandes potências do tempo. Procurou-se transmitir a ideia que o Brasil era não apenas um novo país, mas uma potência.
Numa clara afirmação de força internacional, invadiu a Guiana Francesa (1808-1817) e a Provincia Cisplatina (atual Uruguai), anexada em 1821, em represália ao auxílio dado pelos espanhóis à invasão francesa de Portugal. Através de hábeis manobras políticas, militares e diplomáticas continuou a expandir as fronteiras do Brasil na América do Sul.
Finanças Públicas.
Criou o Banco do Brasil, a Casa da Moeda e outras instituições próprias de um Estado independente.
Defesa.
Num mundo em guerra tratou de imediato em assegurar a defesa do Brasil, reconstruindo as suas fortificações, melhorando o exército e marinha de guerra. Criou a Real Militar (1810), a Academia da Marinha, um Conselho Militar, uma fábrica de pólvora, organizou fundições de ferro, etc. Atendendo às necessidades de militares especializados, contratou profissionais como os tenentes engenheiros Halfeld e Koeler, o major Schaeffer que trouxe mercenários da Alemanha, para formar o "Corpo de Tropas Estrangeiras", etc.
Prosseguindo uma forte política de unidade nacional, em 1817, aniquilou com tropas vindas de Portugal a Revolução de Pernambuco que pretendia separar Nordeste do resto do Brasil.
Comércio.
Os portos do Brasil foram abertos ao comércio mundial (28/1/1808), criando múltiplos mecanismos de controlo do comércio e navegação marítima. Foi criada a Junta Geral de Comercio, Despachante das Embarcações que saíssem dos portos (7/06/1809), Mesa de Despacho Marítimo que, além de outras atribuições, regulava a maneira pela qual deviam ser efetuados os Despachos dos navios que saíssem dos portos (3/02/1810), etc.
Industria.
Autorizou e incentivou a criação de manufacturas, pondo a um decreto datado de 1785 (D.Maria I). Entre as muitas manufacturas que então surgiram, sobressaem as seguintes a primeira fábrica de Vidro (Salvador, 1810), seguiram-se outras de tecidos, ferramentas, corantes, óleos de iluminação, ferro (Usina de Ipanema nas províncias de São Paulo e Minas Gerais), pólvora, etc.
Agricultura.
A produção agrícola foi incrementada:o açúcar e o algodão, passaram a ter primeiro e segundo lugar nas exportações. Incentivou a produção de Café. Em 1810 ou 1812, D. João VI mandou vir de África, sementes de café e distribuiu-as pelos fidalgos que tinham terras no vale do Paraíba e norte de São Paulo. Ele mesmo, com as próprias mãos, dava-lhes pequenos sacos com as sementes e estimulava o seu plantio. Outras das plantações que procurou introduzir no Brasil foi o Chá da China, tendo para o efeito contratado cerca de 200 chineses, muito experientes no seu cultivo. Um cultivo que se revelou um falhanço.
Não ficou por aqui a sua ação, pois está ligado ao estudo cientifico de novas plantas a cultivar no Brasil. Nesta época são introduzidos no Brasil os célebres Cavalos de puro sangue da Caudelaria de Alter do Chão (Alentejo, Portugal). Foi igualmente criada uma Aula de Agricultura na Bahia (1812).
Colonização Interna.
O Brasil em 1808 era uma enorme colônia, mas fracamente povoada, sendo o trabalho realizado por escravos. Embora não tenha acabado com a escravatura, limitou os abusos dos brancos em relação aos escravos.
Tomou as primeiras medidas para substituir a mão-de-obra escrava, por trabalhadores assalariados fomentando a Emigração. Em 1818 deu início ao processo de colonização no Brasil, trazendo colonos estrangeiros. Emigrantes suíços criaram, neste ano, Nova Friburgo, famílias alemãs estabeleceram-se em Ilhéus, São Jorge (Capitania da Bahia), etc. Trata-se uma verdadeira revolução no contexto colonial.
Comunicações.
Ainda antes de chegar ao Brasil já D. João VI estava a ordenar um vasto plano de abertura de estradas de modo a ligar todo o território, por exemplo, a importante estrada entre Rio de Janeiro e a Bahia. Uma rede de fortificações ao longo destas vias garantiam a sua segurança dos Índios. Todos os portos foram complemente remodelados. a a
Saúde Pública.
Entre as muitas medidas que foram tomadas para melhorar a saúde pública, regista-se a criação da Escola de Cirurgia da Bahia e da Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro (1808), Botica Real (1808), Junta Vacínica (1811),etc.
Educação.
A ação de D. João VI, embora muito centrada no Rio de Janeiro, Salvador e Bahia, foi notável no domínio do ensino, rompendo com o passado. Para além de ter criado muitas escolas elementares, está ligado também a criação da Escolas de Comércio, a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios e a Academia de Belas-Artes
Ciência.
É espantosa a obra de D. João VI no Brasil. Entre outras fundações de raiz conta-se o Observatório Astronômico e o Jardim Botânico, criado em 1808, destinado à cultura de plantas exóticas, é um parque sem rival no mundo dada a variedade de espécies cultivadas. Oficiais portugueses enriqueceram-nas com preciosas colecções de plantas vindas de todo o Império, mas também das Maurícias e das Guianas Francesas. Na àrea daQuímica, entre os laboratórios criados no Rio de Janeiro, o Laboratório do Conde da Barca (1808-?), o Laboratório Químico-Prático do Rio de Janeiro (1812-1819), etc.
Aproveitou todas as ocasiões para mandar vir cientistas para estudar o Brasil. Entre elas destaca-se a Missão científica patrocinada pelos governos da Áustria e da Baviera, que acompanhou a princesa Leopoldina de Habsburgo que em 1817 chegou ao Brasil para se casar com o príncipe D. Pedro. Era constituída entre outros por Johhann Christof Mikan, botânico e entomólogo; do Dr. Johann Emanuel Pohl, Médico, mineralogista e botânico; de Johann Buchberger, pintor de plantas; de Johann Natterer, zoólogo; de Rochus Schüch, mineralogista e bibliotecário; sem esquecer ainda a presença do jardineiro botânico Heinrich Schott. A esta missão se juntaram ainda, a convite do Imperador da Áustria e da Baviera, dois viajantes e pesquisadores que se celebrizariam pelos seus depoimentos e escritos sobre o Brasil da época: o zoólogo Johann Baptista Spix e o botânico Karl Friedrich Philip Von Martius.
Imprensa.
Em 1808 a Brasil vivia uma verdadeira revolução cultural, numa assentada é criada a Imprensa Real e são fundados os primeiros jornais do Brasil, um no Rio de Janeiro (Gazeta do Rio de Janeiro) e outro na Bahia. Foram editadas obras de muitos autores e traduções de obras científicas. O número de jornais não parou de aumentar, revelando uma crescente abertura do Brasil em relação ao mundo.
Bibliotecas e Museus.
Em 1807 acompanharam a Corte várias bibliotecas arquivos de Portugal. Nos anos seguintes outras continuaram a ser despachadas para o Brasil. Em 1810 fundou a Biblioteca Pública. A 6 de Junho de 1818 é criado por iniciativa, o Museu Real(Museu Nacional da Quinta da Boa Vista ligado à Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Artes.
Para transformar o Rio de Janeiro, numa capital similar às principais capitais europeias, investiu enormes somas na vinda de artistas e músicos, mas também na realização de manifestações artísticas e religiosas. Entre as mais importantes instituições que criou destaca-se a referida Academia de Belas Artes e o Real Teatro S. João (atual Teatro João Caetano).
Entre os muitos músicos estrangeiros que passaram pelo Brasil, destaca-se em 1816, o austríaco Sigismund Neukomm, discípulo predileto de Haydn, acompanhou o Duque de Luxemburgo, enviado pelo rei Luiz XVIII da França ao Rio de Janeiro a fim de levar os cumprimentos reais ao recém coroado D.João VI. Em quatro anos escreveu inúmeras obras, algumas com temas luso-afro-brasileiros, como o lundum, modinhas, etc.
Desta vasta ação tem sido destacada também a Missão artística Francesa, que chegou ao Rio em Março de 1816, dela faziam parte, entre outros, Joachim Lebreton (pintor), Nicolay Antoine Taunay (pintor), Auguste Marie Taunay (escultor), Jean-Baptiste Debret (pintor), Augusto Henrique Vitorio Grandjean de Montigny (arquiteto), Sigismund Neukomm (compositor, organista e mestre-de-capela). Um excelente exemplo da obra desta Missão é a "Casa França-Brasil", mandada erguer em 1819 por D. João VI, ao arquiteto Grandjean de Montigny.
Remodelação do Rio de Janeiro.
A chegada da família real, acompanhada de 10 mil pessoas, provocou uma alteração completa numa cidade que na altura contava com cerca de 60 mil habitantes. As obras de remodelação da cidade iniciaram-se em 1808, alterando profundamente a sua fisionomia. Entre as largas centenas de edifícios privados e públicos construídos ou completamente alterados, contam-se o Palácios de S. Cristóvão e o Palácio de Santa Cruz. O facto de ser a capital de um Império Mundial, fez afluir ao Rio de Janeiro estrangeiros das mais variadas partes do mundo, tornando-a numa cidade cosmopolita nos trópicos. Em 1820 contava já com 100.000 habitantes.
D. João VI regressa a Portugal a 26 de abril de 1821, deixa atrás de si o seu herdeiro ao trono - D. Pedro -, que de acordo com o esperado ( ou planeado ? ) não tardou a declarar meses depois a independência do Brasil (1822), uma monarquia num continente dominado por repúblicas.
A transição política foi feita sem grandes convulsões. Com esta estratégia de D. João VI foi possível manter até 1889, num e outro do Atlântico a mesma dinastia dos "Braganças". Uma das grandes preocupações deste monarca absolutista.
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